terça-feira, 25 de agosto de 2015

TADEU BAHIA FILOSOFA SOBRE O FILÓSOFO FRIEDRICH WILHELM NIETZSCHE - "O ANTICRISTO"

TADEU BAHIA - Autor

1ª. PARTE

  
“Com isso concluo e pronuncio meu veredicto. Eu condeno o cristianismo, levanto contra a Igreja cristã a mais terrível das acusações
que um acusador jamais tenha pronunciado.  Para mim ela é a maior das corrupções concebíveis...” (NIETZSCHE)

"FIAT JUSTITIA, RUAT COELUM"

                   Nascido Friedrich Wilhelm Nietzsche, na cidade de Rocken, na Alemanha em 15 de outubro de 1844... conseguiu sobreviver até os 56 anos, até quando a sua própria loucura o matou.       
                   Os católicos ferrenhos pregavam/pregam que a loucura do Nietzsche (1844–1900), foi um castigo divino, fruto das suas injúrias contra Deus e a Religião Católica, amplamente propagadas no volume “DER ANTICHRIST, FLNCH AUF DAS CHRISTTENTUM” (O Anticristo). Porém, o paradoxo disso tudo é que as palavras enraivecidas do filósofo e pensador alemão nascem dos lábios de um homem formado em teologia e filosofia, além de ter sido professor universitário e reconhecido filósofo militante, marcante do seu próprio tempo. O seu espírito revolucionário, indócil e sempre em ebulição constante nos lembra o perfil do cineasta baiano, Glauber Pedro de Andrade Rocha, o saudoso e eruptivo Glauber Rocha, redivivo nas sábias palavras do mestre, poeta e jornalista João Carlos Teixeira Gomes através da sua magnífica obra: “Glauber, esse vulcão”.         

                   Precisaríamos de um escritor e memorialista de mão cheia, igual ao caríssimo João Carlos, acima citado, para fazer explodir em cataclismos, os mais loucos, toda a Obra Nietzschiana, cujo principal mérito foi o de cortar o velho e desgastado “cordão umbilical” que unia, até àquele época, os conhecimentos antigos que eram alicerçados no pensamento gregoriano. Assemelhando-se ao Glauber Rocha com os seus atos intempestivos, os quais, sob a visão “normal” dos demais humanos eram considerados ilógicos e abusivos, a lógica do Glauber e a do Nietzsche se assemelham ainda ao espírito desbravador, barroco e ante a tudo vulcânico do também poeta baiano Gregório de Mattos e Guerra, quando, ao seu tempo e antecedendo em séculos o próprio Nietzsche, o então poeta baiano, à semelhança do Voltaire, voltava-se contra Deus e a Religião Católica em versos explosivos e viperinos que a nossa língua pátria pouco caso fez. Não fossem a abnegação, os esforços e as dedicações constantes do James Amado, Gilfrancisco, João Carlos Teixeira Gomes, Fernando da Rocha Perez e deste modesto autor, o próprio Gregório de Mattos e Guerra seria mais um escritorzinho fudido e de merda, sem nenhuma importância ou significação para a nossa língua, como todo e qualquer desconhecido poeta... No entanto, o Nietzsche foi o seu próprio vulcão, a sua própria e transbordante loucura, bem como as suas próprias teses e antíteses, pois escoimando de uma maneira atroz a Religião Católica, na qual dizia ser a religião dos fracos, covardes e submissos, levava o dogma da incerteza aos espíritos crédulos e demolia – com um só golpe – todas as considerações ditas teológicas sobre a pretensa criação de Deus.

                   O Deus Cristão não existe. O que existem são o medo e a ignorância dos homens frente aos acontecimentos materiais – alguns até aquelas épocas inexplicáveis sob a luz ainda bruxuleante e fraca de uma ciência que nem era reconhecida como tal – onde era acrescentada ainda a pouca visão e quase nenhum conhecimento científico de que não dispunham os homens daquele período, onde os acontecimentos hoje considerados os mais simples, são esclarecidos através de uma pesquisa boba no Google, na internet. Porém, na pequenez cósmica daquelas inteligências mal iluminadas de então, transformavam-se em “fenômenos”, em “milagres”, onde eu acrescento ainda que o “estado de coma” que sofreu o próprio Jesus Cristo após a sua crucificação, ao sair naturalmente do período crítico do coma, foi considerado pelos católicos de carteirinha como sendo o próprio “Filho de Deus Ressuscitado e Vivo”! Que diriam os homens daqueles tempos se soubessem que eu próprio já entrei em coma por duas vezes... Na primeira vez fiquei inconsciente por quase dois meses; muitos anos depois, na segunda vez, fiquei cheio de tubos, máscaras, respirando e monitorado por aparelhos e nunca nenhum dos médicos do Hospital Couto Maia ou do Hospital Espanhol me reconheceram como um Deus ou um Tadeu qualquer ressuscitado! Por duas vezes devolveram o meu caixão às respectivas Casas Funerárias... Nem por isso subi ao céu carregado por anjos e envolto em nuvens poéticas, resplandecentes e ofuscantes!

                   Simplesmente voltei para casa de táxi e não carregado por uma legião de anjos celestiais...

                   A pequenez científica dos homens de dois séculos passados não acolhia dentro do seu pouco conhecimento, toda aquela imensa e maravilhosa gama de acontecimentos e/ou fenômenos naturais – e inexplicáveis para o seu frágil espírito, onde não encontrando palavras para ilustrar o que lhes acontecia à volta, atribuíam-nos conotações “divinas”, sobrenaturais. Para Nietzsche o divino não existe, por conseqüência, os “milagres” também não. Se o divino existisse seria o próprio Homem! Teríamos então a explicação do “super-homem”, do Super-Homem Cristão, dignificado na terra pela figura do Jesus Cristo, enquanto paralelamente os americanos criaram o Super-Homem na figura dócil e andrógina do jornalista Clark Kent... Essas palavras para tentar explicar – em paródia – como os padres criaram o seu super-homem na pessoa do Jesus Cristo, assim como os primeiros beatos, apóstolos, visionários, Abraão e o Moisés da estória bíblica criaram o seu próprio Deus e a sua corte de demônios e anjos celestiais... Para mim, quem sabe sintetizar a estória bíblica não é Deus nem o Lúcifer... é o poeta florentino Dante Alighieri, que visualizou na sua transcendente loucura medieval os cantos, recantos e os encantos do céu, purgatório e do inferno... Foi esse poeta italiano quem escreveu o “poket-book” da Bíblia, conhecido universalmente como “A Divina Comédia”!

                   Os homens criaram Deus à sua imagem e semelhança, não ao contrário; se fossemos criados por Deus à imagem e semelhança dele – seria muita presunção da nossa parte, meros e decadentes mortais. Criamos também a Bíblia, simples “Manual de Instruções” da Religião Católica e da pretensa e inusitada imprensa celeste, onde sobre o assunto, no seu prólogo o Gênesis ainda postula e teima que de fato Deus criou o homem a sua própria imagem e semelhança... É uma pena porque somos totalmente dessemelhantes, como profetiza o poeta barroco Gregório de Mattos e Guerra nos seus versos viperinos e maravilhosos contra os ora governantes da cidade da Bahia no século dos seiscentos: “Triste Bahia... o quão dessemelhante”.  Nietsche nunca achou nada disso, ele postula o ser hiperbóreo, dignificado no super-homem nórdico, habitante das geleiras acima da linha boreal, setentrional, onde existia uma civilização mágica, e que, segundo o Apolo, seria habitada pelos próprios deuses. Falava-se que os homens hiperbóreos seriam despreocupados, sonhadores e felizes, na sua maioria poetas, compositores e hábeis tocadores de violão... na certa eles seriam os ancestrais dos atuais baianos...

                   O Nietzsche cultuava a idéia de que existiam esses homens hiperbóreos e que os mesmos já tinham alçado a um estágio superior, distinguindo-se dos simples mortais pela ausência absoluta dos sentimentos terrenos e efêmeros da piedade, tolerância, fraqueza e/ou do sofrimento. Preconizava que esses super-homens estariam sempre em um estado de contínuo renascimento e crescimento e que teriam o condão de determinar o bem e o mal, sem levar em conta os esquálidos pontos de vista da igreja, ou mesmo da atrasada sociedade de então. A felicidade do super-homem nietzscheziano, leia-se seres hiperbóreos, seria determinada através dos seus próprios valores, centrados em constantes mudanças na busca do prazer absoluto. Segundo o Nietzsche o seu super-homem não acreditaria, sob nenhuma hipótese, em Deus, ou em quaisquer espécies de deuses e ainda teriam nas suas consciências as assertivas de que somente os fracos restringem, tentam em vão impedir, o crescimento dos mais fortes. Outra contradição que pode ser observada nesse gênio é que sua aparência triste, acanhada, sobretudo tímida e freqüentemente solitária, não condizia em nada com o seu estado de espírito sempre inovador, nem com o contido nos seus escritos delirantes, sempre plenos de uma energia inesgotável, característica marcante do transloucado e sempre polêmico autor.

                   Diante de tudo o que o Nietsche falou com relação à Religião Católica e o Cristianismo, este autor, após ter lido Os Sermões, do padre Antônio Vieira e quando criança tendo estudado muito sobre a vida do padre José de Anchieta e do São Francisco de Assis, posiciona-se no seguinte: se Deus não existe, de que adianta hoje em dia tanta propaganda divulgada estoicamente na mídia, quando sabemos que desde as priscas eras é a própria Igreja Católica quem sustenta e divulga as suas próprias criações e lendas, os seus pretensos mitos, supostos milagres, visões e aparições de cunho celestial, bem como estórias difundidas por esses pregoeiros acima citados, que nas companhias dos antigos apóstolos difundiam pelos quatro cantos do planeta, tanto à população civilizada da época, bem como os seus escravos e a aos gentios, nas regiões mais distantes, a sua pretensa filosofia... ai é que chega o Nietzsche com suas palavras vulcânicas e destemperadas e sem mais delongas os classifica a todos na categoria de “malucos” e “louco varridos”! O José de Anchieta e o São Francisco de Assis não passavam de loucos, na visão dos seus próprios contemporâneos e ainda carregavam o epíteto chulo de simples visionários, mas que a teimosia da Religião Católica os classificou de “santos”, como santos eram adjetivados todos aqueles que faziam/fazem propagandas de Deus, das suas supostas benesses, ou garantem aos crédulos das pretensas existências de um céu cheio de anjos, virgens imaculadas e varões santificados, assim como um inferno cheio de demônios horripilantes e vermelhos, de caudas grandes e chifrudos, que sob o comando dos dinâmicos e sempre atuantes Satanás e do Belzebu, aterrorizavam os dias e as noites misteriosas, escuras e ignóbeis da humanidade.

                   Eis aí a propaganda da miséria, da miséria lata e mais profunda: o enganar as consciências, fazer uma autêntica lavagem cerebral naquelas pessoas ignorantes que envolvidas nas estórias fantásticas criadas pela Religião Católica e os seus seguidores, eram arrebanhados como mansos cordeiros a fim de fazerem parte do abençoado e pacífico rebanho que em breve os levaria a conquistar o Reino dos Céus. Como já dizia o Nietzsche: a Igreja Católica corrompia a alma dos seres humanos para cumprir maleficamente os seus desígnios, promovendo a “corrupção espiritual”, estabelecendo o tumulto do ser ou não ser católico no âmago daqueles homens mal iluminados de outrora, criando a sua própria “Ditadura Espiritual” cognominada de “Santa Inquisição” que agia igual a um pretenso e vingativo Deus, prendendo, torturando, estuprando, currando e matando todos aqueles que eram contra os seus dogmas... a mesma coisa que fez a inesquecível e sempre lembrada “Ditadura de 1964” no Brasil, quando foi implantado o suposto “Regime Militar” no nosso país... quando o “militarismo” tempos depois se fundiu com o “oportunismo” e nos fez frutos de uma Nação sem memória histórica, sem padrões de caráter, morais e éticos de conduta etc:. etc:. Assim como os ditadores de ocasião, lembrados no “Último Discurso” do imortal Charlie Chaplin, ainda segundo o Nietzsche, a Igreja Católica criava a sua corrupção a fim de se perpetuar ao criar nas almas dos homens o câncer maléfico do pecado, que eu classifico como: hóstia negra, cânhamo delirante, ácido lisérgico perfeito que envolveu e inebriou os fracos de espírito de todas as épocas. O Nietzsche ainda questiona na sua obra “O Anticristo” a pretensa “igualdade das almas perante Deus” classificando-a de pura hipocrisia, bem como adjetivando os “benefícios humanitários” em dinamite cristã do próprio cristianismo, palavreados esses que são contínua e ultimamente expostos nos últimos anos pelos diversos papas nas suas confusas e senis encíclicas e bulas papais.

                   Observo que o Nietzsche pensava, em parte, de acordo com o postulado sagrado dos Illuminati, também conhecidos como Moriah, ou seja, aqueles seres incorpóreos e belos, nobres detentores da Luz. O próprio Lúcifer cognominava-se “Estrela da Manhã” e era o membro maior, espécie de Grão-Mestre da “Nobreza Negra”, aqueles espíritos encarnados pertencentes às treze Famílias que desde muito tempo atrás e até hoje dominam o mundo, decidindo/direcionando/ditando as ordens políticas, sociais e econômicas de todos os governos da Terra. Essas famílias seriam, a saber: Astor, Bundy, Collins, DuPont, Freeman, Kennedy, Li, Onassis, Reynolds, Rockfeller, Rothschild, Russel, Van Duyn (Merovíngeos). Esse grupo seleto de Famílias faz parte da acima citada "Nobreza Negra" e como já foi dito, são elas que decidem e estipulam as regras para elegerem ou derrubar presidentes, restabelecer, criar e/ou destruir governos. Os seus membros nunca são conhecidos do público, uma vez que as suas ações e palavras são tão sutis que escapam ao exame mais acurado dos simples mortais. Seus laços familiares provêm das noites dos tempos, existindo há milhares e milhares de anos e iguais aos santamarenses, eles são muito ciosos em manter a linhagem familiar, nunca deixando corromper ou quebrar esses laços. Lastreiam-se em dois sólidos pressupostos que são o Ocultismo e a Economia, cadê os nossos amigos judeus... Detém sob o seu poder todos os bancos internacionais, bem como companhias de petróleo, são donos das melhores indústrias e redes comerciais mundiais, inclusive no setor de automóveis, armas de fogo e alimentos, armamentos nucleares, incluindo o comercio e as telecomunicações, dominando atualmente o mundo virtual através da Microsoft, conseguindo através de hábeis diplomatas e políticos, deter em suas mãos a grande maioria dos governos, controlando-os à distância, ou presentemente, quando necessário. O Ocultismo, a prática ancestral da magia negra freqüentemente ocorre nos cultos e rituais satânicos e secretos praticados pelos Illuminati em todos os pontos da Terra, quando, através de práticas ocultistas e cerimoniais, controlam e manipulam as massas em quaisquer pontos do planeta. Salve o Leonardo da Vinci que no passado foi o Grão-Mestre dos Illuminati do seu tempo...
                                                                                                    
 Não obstante o acima exposto, nunca se ouviu nenhum comentário e tampouco não existem quaisquer documentos por escrito os quais comprovem que o Nietzsche fosse iniciado em sociedades secretas, ou não, tendo em vista a sua natureza explosiva, vulcânica, instável e temperamental, em conseqüência o seu espírito inquieto e indomável nunca conseguiria guardar dentro de si nenhum segredos. A sua iluminação maior veio de dentro de si mesmo, tal o Lúcifer, o qual possuía luz própria e bastava-se com a sua infinita, magnânima e iluminada loucura. Pensadores, poetas, demiurgos, magos e bruxos, historiadores, ciganos e filósofos do tope do Nietzsche estão presentes em todas as épocas da história da humanidade. Desde o suposto Adão, seguido pelo Noé, Abraão, Matusalém, Maquiavel, Maomé, o apóstolo João Batista, Platão, Aristóteles, Leonardo da Vinci, Sir Francis Bacon, Descartes, o iluminado Voltaire, Gregório de Matos e Guerra, Paulo Garcez de Sena, Galileu, Epicuro, Charlie Chaplin, Dante Alighieri, Cícero e outros sábios que sob as auras abençoadas das suas centelhas espontâneas, dotados de uma inteligência superior e invulgar, sacudiram os alicerces, os parâmetros até então conhecidos, abalando com as estruturas frágeis dos pseudo-s - conhecimentos dos cosmos e das coisas do mundo, que até então determinavam/manipulavam/influíam/geriam os destinos espirituais – leia-se: religiosos – de todos os povos da terra. Ressalto, no entanto, as posições firmes e irresolutas das poetisas santamarenses e baianas, Amélia do Sacramento Rodrigues e Mabel Veloso, as quais através a prática diuturna do catolicismo, conceberam versos maravilhosos e belos que hoje emolduram a literatura brasileira, quiçá universal. Apesar de ser bem casado com a minha atual esposa Sueli Rocha Lopes, continuo loucamente apaixonado pela Mabel Velloso e sobretudo a minha inesquecível Lala Velloso, embora ame desesperadamente e por toda a vida a minha pequena e doce Sueli, lembrando daqueles versos antigos dos poetas e compositores Tom Jobim e Vinícius de Moraes, naquela memorável e imorredoura canção, que tocará com toda a certeza nos meus funerais:  

C7+
Eu sei que vou te amar
Ebº                 Dm7
Por toda a minha vida
G7/5+
Eu vou te amar
G7              Gm7               F#7/5+
Em cada despedida eu vou te amar
F7+                            Bb7/9
Desesperadamente eu sei que vou te amar
Em    Ebº    Dm7  G7/5+ G7  Em7  A7/5+
E cada verso meu será pra te dizer
D7/9
Que eu sei que vou te amar
G7/5+      G7
Por toda minha vida
C7+

   Toda vez que lembro essa minha última vontade à Sueli, ela enche os olhos de lágrimas e manda-me calar a boca e deixar de falar maluquices, mas faço questão absoluta de deixar bem claro que se esta música acima não for tocada no meu funeral, eu me dano e mais uma vez saio do caixão e volto a viver novamente... Aliás, com música ou sem música o importante é viver, uma vez que até os surdos de nascença conseguem ouvir a sua própria música!

   O Nietzsche era o “Espírito de Negação” do filosofismo não idealista proposto pela Religião Católica, significado nos seus padres andróginos e aveadados, nas suas freiras lésbicas e outras mulheres donzelas, não comidas e nunca assistidas sexualmente, todos eles (elas) mal dirigidos(as) para o exercício de uma castidade patológica e irreal, onde ancorados(as) por uma tosca e decadente formação pastoral, embasada em símbolos e caracteres irreais, embebedavam-se, drogavam-se com estórias românticas e absurdas acerca da suposta origem de um Deus que tudo sabe, tudo governa, tudo dirige e previamente estabelece... o retrato típico e obscuro de todos os ditadores, Napoleões, Getúlios Vargas, Stalins e Hitleres de todas as épocas.  Todavia, antes do Nietzsche ser caracterizado como o filósofo da negação, foi um estudioso da Religião Católica que logo adiante a renegou, fazendo-me lembrar de recente entrevista do Nelsinho Motta com a Da. Canozinha Velloso, mostrada em meados de julho de 2009 numa rede televisiva, quando a ilustre matriarca foi perguntada sobre o suposto ateísmo do compositor santamarense Caetano Veloso, propagado aos quatro ventos desde o início da década de 1970 pelo ora nominado cantor, o qual se autodenominava como sendo “o avesso do avesso”. Somente nos dias de hoje, depois dos sessenta anos de idade, é que o epíteto do Caetano se acomodou e tivemos das suas concepções ateístas, apesar de ainda propagar-se ateu, as nossas dúvidas em parte dirimidas através das palavras firmes e nonagenárias da adorável, doce e querida Da. Canozinha Velloso, quando a mesma na entrevista acima mencionada, ao responder ao Nelsinho Motta sobre o ateísmo do Caetano Veloso, que o mesmo não era ateu e “...que tudo aquilo era maluquice dele, pois quem anda com a medalhinha de Nossa Senhora no pescoço não é ateu coisa nenhuma!”  Aí estão manifestadas as palavras que falam da incerteza exposta nas aferições ditas ateístas do Caetano Veloso, que sob o meu modesto ponto de vista nominou-se ateu para entrar na moda, em confronto com a resposta irrefutável e universal da sua Mãe, a Da. Canozinha Velloso, que até os dias de hoje alimenta o seu Espírito iluminado nos ditames católicos do final do Século XIX até os dias atuais. O Nietzsche, caso estivesse vivo, sorriria dos dois: da incerteza ateísta-intelectual do Caetano e da certeza imutável espontânea e doce de Da. Canozinha Velloso. Sou testemunha presente e ocular de que a Família Velloso sempre anda a se reciclar espiritualmente, que o diga a famosa “Trezena de Santo Antônio” que ocorre todos os anos na casa da Mabel Velloso, no bairro barroco do Tororó, em Salvador - Bahia, cujo altar trezenal é refeito dia após dia pelo primogênito Rodrigo Velloso, sob os olhares curiosos e abençoados da minha Lala, ainda da Belô, Jú, Jorginho e Aninha Velloso.

   No contraponto destas linhas, acrescentamos que a origem intelectual do Nietzsche punha dentro do seu Espírito conturbado, sob o véu das suas certezas absolutas, todas as incertezas absolutas dos clérigos, beatos, padres e demais católicos que deambulavam crentes na suposta ressurreição que era/é constantemente comentada e relembrada nas sacristias toscas e mal iluminadas pelo mundo afora, em altares antigos e enriquecidos de ouro, prata e púrpura, demonstrando no seu régio aparato e riquezas materiais, o contraste pregado próprio Jesus Cristo, caracterizado pelo seu Evangelho de Humildade, nos fazendo recordar da figura mágica e mística do saudoso e querido Dom Hélder Câmara nas suas pregações ditas comunistas, sob os olhares desconfiados do Regime Militar de 1964. Dom Hélder Câmara nos lembrava um autêntico pregador camponês, diria eu um “Guevara de Batina” que compondo o seu rebanho às feições do próprio Jesus Cristo, pregando aos humildes, aos camponeses sem terra, levando palavras duras contra os latifundiários, exploradores da mãos de obra baratas e às vezes gratuitas do homem do campo, sugando-lhes as energias em seu próprio favor, bem como declamava históricos sermões e homilias contra os presidentes e autoridades militares de então. Não tenho informações oficiais de que tentaram assasiná-lo durante a escura e escusa vigência do Regime Militar, mas de nada duvido, mas Dom Hélder Câmara - a semelhança dos Mestres Maçons - nada falava, nada comentava, no entanto trazia a todos nós a magia translúcida do seu sorriso sábio, abençoado e fraterno. Todavia eu entrevia sob a manta sagrada do seu sorriso doce, as auras facilmente perceptíveis das ameaças veladas que pairavam silenciosas, férteis e assassinas contra a sua iluminada pessoa, a qual, apesar de pequenina e frágil, demonstrava a sua força acurada e febril através da potência intelectual e feérica das suas palavras eloqüentes e verdadeiras, dando-nos autênticas lições de Democracia e, sobretudo , postulados morais e éticos que nunca existiram no coração e na consciência do Nietzsche, o qual, antes de tudo, foi um ser paradoxalmente iluminado, pois o Nietzsche nada tinha de obscuro no sentido mais lato do termo, ele tinha a sua luz própria, era igual ao Satã ou ao Lúcifer, sendo realmente possuidor de um espírito auto - iluminado, polêmico e absolutamente contraditório em relação aos dogmas e filosofias propostas pela Religião Católica e os seus seguidores, quando esses faziam as suas ortodoxas manifestações, exercidas nos altares medievais e barrocos das inúmeras igrejas cristãs pelo mundo afora...

   Desde criança o pequeno Nietzsche era um aluno brilhante, logo apelidado pelos seus colegas de "pequeno pastor", tendo em vista serem os seus avós pastores protestantes. Ganhou uma bolsa de estudos aos 14 anos para Pforta, onde estudou e obteve ganhou fluência em grego e latim, oportunidade em que começaram os seus primeiros questionamentos contra a Religião Católica. Dando seqüência aos seus estudos, rumou para Bonn com o objetivo de estudar filosofia e teologia. Mais tarde, por intermédio de um dos seus professores, foi residir em Leipzig com o objetivo de estudar filologia e aos 24 anos foi nomeado professor de filologia clássica na Universidade de Basiléia, oportunidade em que apresentou o seu primeiro trabalho de ordem acadêmica, intitulado: "A Origem e Finalidade da Tragédia", escrito no ano de 1871, exatamente no mesmo período em que conheceu o renomado compositor Richard Wagner, o qual residia numa casa de campo, situada bem próxima ao lago de Lucerna, imediações de Tribschen, onde buscou e verdadeiramente encontrou refúgio, tranqüilidade e inspiração, não só para acomodar, ao seu modo, o seu inquieto Espírito, como também para criar as suas criações filosófico-literárias, quando ainda em 1871 publicou o seu primeiro livro, "O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música", sendo bastante influenciado nas obras do Wagner e do Schopenhauer. A estadia do Nietzsche na Universidade de Basiléia foi efêmera, somente por curtos oito anos, pois no ano de 1879 começou a ter intensas e constantes crises de cefaléia, originados por problemas de visão e já manifestava dificuldades para se expressar, interrompendo as suas tarefas universitárias por um ano. Ao tentar voltar as suas atividades acadêmicas, passou por problemas nas cordas vocais que tornaram as suas palavras quase inaudíveis, quando no ano de 1879 e praticamente cego, Nietzsche abandona de vez a universidade, dedicando-se exclusivamente à escrita. O reconhecimento dos seus escritos chegou tardio, já perto da sua morte, ocorrida em 25 de agosto de 1900 quando ainda contava 56 anos, na mesma idade em que faleceu em 1998, na Bahia, o compositor, letrista e também polêmico poeta baiano, Paulo Garcez de Sena.

   Homem sempre apaixonado e nunca correspondido, apesar da sua loucura o Nietzsche também passou por problemas sentimentais quando foi rejeitado pela Lou Andréas Salomé, jovem finlandesa com quem pretendia se casar, ocasião em que ficou bastante abatido, diante desse amor verdadeiro e desbragado nunca correspondido. Sempre digo que às vezes a falta do amor aborrece, mas quando ele existe e é o nosso verdadeiro e único Amor, este realmente nos adoece e nos tornamos fragilizados e mártires da nossa própria paixão. Por causa desse fracasso amoroso o Nietzsche voltou a residir nas companhias da sua mãe e da irmã Elisabeth, vivenciando um quadro patológico de muita solidão e visível sofrimento.

Lembro das minhas crises emocionais de paixão doentia vividas no final da década de 1960, precisamente em meados de 1968/1972 na pequena e romântica cidade de Amélia Rodrigues, situada no Recôncavo da Bahia, perto de Santo Amaro da Purificação, no auge do Movimento Tropicalista e ainda no esplendor dos meus 16 até aproximadamente 21 anos de idade, quando fui rejeitado fragorosamente ao pedir uma colega de ginásio em namoro, justamente quando ela seria realmente a minha primeira namorada e eu já contava como casamento certo. Sonho inútil... Igual ao Nietzsche também nunca foi correspondido! Vivi anos de muito sofrimento e dor, seguidos de momentos ansiosos e neuróticos de quase loucura, ficando constantemente instável e visivelmente nervoso, atrasando em muito o meu futuro bem como retardando o meu ingresso na Universidade, prejudicando-me enormemente nos meus estudos, naqueles anos tumultuados e marcantemente insones da minha vida, quando saía a beber naquelas noites inesquecíveis e maravilhosas na companhia boêmia e esculachada dos amigos e era freqüentemente encontrado no prostíbulo do “Morre Sem Vela” ou na “Casa de Dete” a  dormir nas companhias de mulheres dadeiras e suspeitas. Tornei-me um notívago em potencial, oportunidade em que ficaram de vez desabrochadas no meu espírito a tendência para escrever versos, versos maravilhosos e imorredouros de amor, tornei-me Poeta no sentido mais lato da palavra... naquela época escrevi versos inesquecíveis e  belos que foram publicados tanto no jornal da Juventude Católica de Amélia Rodrigues – JUCAR bem como anos mais tarde nas páginas do ora extinto JORNAL DA BAHIA, onde expunha ao público e desbragadamente as minhas declarações de amor, em letras de forma...

 Vivíamos naquela época encantada de início da década de 1970, a Era Iluminada pelo uso dos alucinógenos e anfetaminas, quando no Brasil o uso da maconha já engatinhava os seus primeiros passos mágicos pelas ruas, praias e teatros, na alta sociedade e universidades em geral, no próprio meio artístico-cinematográfico-musical, nas largas e possantes avenidas até as modestas vielas e morros nacionais. Tivemos muitas cabeças mal informadas no país que foram de encontro à difusão da prática ora em nascedouro, quando a maioria dos neo - fumantes foram subjugados com brutalidade e conseqüentemente castrados no seu direito de fumar a maconha, através da truculência de militares mal preparados, oriundos de uma formação mal direcionada e incompetente, de baixo e rudimentar quociente intelectual, os quais eram regidos sob força coercitiva de um regime político autoritário e imbecil, quando os usuários eram ainda excomungados pela mesma Igreja Católica que o próprio Nietzsche desde o século passado já escoimava, sendo freqüentemente detidos e barbaramente espancados pelas pretensas autoridades policiais de então. Nesse período de castração intelectual e fúria apolítica, obscurecido pela ira ensandecida das autoridades militares de plantão sediadas nas casernas/cavernas palacianas em Brasília, as pessoas da cidade de Amélia Rodrigues me achavam um louco de marca maior, sem saberem as verdadeiras razões dos meus sofrimentos. Naquela época eu usava os cabelos longos e mal penteados, roupas extravagantes e coloridas, colares de metal e miçangas penduradas no pescoço, sandálias franciscanas nos pés, num autêntico visual “hippie” e pregando a filosofia “make love, dont war” enquanto ouvia as baladas românticas dos The Beatles, Jane Joplin, Jimi Hendrix e Rolllies Stones, enquanto a guerra do Vietnam ceifava a vida de milhares e milhares de jovens inocentes.  Enquanto isso, milhares de hippies já curtiam o Nietzsche, desde as praias ensolaradas de Copacabana até as ruas descalças e alucinógenas das praias de Arembepe e do Arraial d’Ajuda, na Bahia...

TADEU BAHIA:.

 st.tadeubahia@gmail.com




sábado, 8 de novembro de 2014

ALEXANDRE ROBATTO FILHO, O PIONEIRO DO CINEMA NA BAHIA

TADEU BAHIA - Autor

Quem já leu as páginas deliciosas de apimentadas do romance Dona Flor e Seus Dois Maridos, do escritor Jorge Amado, já deve ter tido a oportunidade de conhecer uma das inúmeras e infinitas facetas do Alexandre Robatto Filho.
Nascido em 04 de novembro de 1908 na Praia do Cantagalo, Freguesia dos Mares, em Salvador, estado da Bahia, era filho de Alexandre Robatto que exercia a profissão de protético na então pacata cidade de Salvador, (de descendência italiana pelo lado paterno) e da Da. Camilla Rocha Robatto que era natural de Saubara, pequena localidade praieira localizada no Recôncavo Baiano, até há pouco tempo pertencente ao município de Santo Amaro da Purificação.
A Da. Camilla Robatto era natural de Saubara, sendo uma das filhas do segundo casamento da Sra. Perpedigna Amélia da Cunha Rocha com o Prof. Ernesto Rocha. A Sra. Perpedigna Amélia da Cunha Costa - que seria a avó materna do futuro cineasta baiano Alexandre Robatto Filho – havia contraído as primeiras núpcias com o Ignácio de Jesus Costa e com este tivera quatro filhos, a saber: Alcebíades da Cunha Costa, Eudóxia da Cunha Costa, Perpedigna da Cunha Costa e Ana da Cunha Costa (Naninha).
Todavia, o seu primeiro marido, Ignácio da Cunha Costa, teve uma morte prematura (insuficiência cardíaca) o que levou a Perpedigna Amélia da Cunha Costa a contrair suas segundas núpcias com o Prof. Ernesto Rocha, filho do Padre Camilo Rocha que era então vigário da Freguesia de Saubara.
Desse seu segundo casamento com o Prof. Ernesto Rocha, ela teve mais duas filhas: a primeira foi a Camila Robatto (note-se a “homenagem” ao avô-Padre!) que seria a mãe do futuro cineasta Alexandre Robatto Filho e da sua irmã Cibele Robatto. A segunda filha seria a Ernestina Rocha (Sinhá ou Sassá como era tratada carinhosamente nos círculos familiares) que não casou, mas no papel de tia – avó ajudou com paciência e ternura a criar mais de duas gerações.
Mas voltemos ao Alexandre Robatto Filho! Desde criança já mostrava que tinha uma inteligência rara e brilhante, formando-se ainda muito jovem em Odontologia, logo iniciando a sua profissão. Porém, ao lado da atividade de cirurgião-dentista, dedicava-se às artes de uma maneira plena e desbragada. Era um verdadeiro artista no sentido mais lato da palavra e exercia com grandiosidade e eloqüências esses atributos divinos que o Criador lhe concedeu.
Inicia as suas atividades no cinema no ano de 1938, contudo, antes dele encontraríamos ainda as figuras do Diomedes Gramacho e do José Dias da Costa que perderam para Alexandre Robatto Filho a primazia de serem os pioneiros do Cinema Baiano, porque, temendo acidentes nos seus primitivos estúdios, devido às películas daquela época ser constituídas de material altamente inflamável e que poderiam provocar incêndios de gravíssimas proporções, então esses dois senhores perderam grande quantidade de material cinematográfico. Além disso, com medo de que acontecessem tragédias maiores, eles incineraram o resto das películas que tinham em seu poder, destruindo dessa forma o já escasso material que poderia servir de base, de referências para o estudo da história do cinema na Bahia.
Dessa maneira, o pioneirismo do cinema na Bahia fica sendo patenteado exclusivamente a Alexandre Robatto Filho que iniciando naquela época, em 1938, ao longo de 25 preciosas curtas – metragens de arte, folclore, músicas e folguedos regionais, bem como documentários sobre a Bahia do seu tempo, conseguindo reunir valioso acervo constante de 22 títulos que foram contratipados e copiados pelo Departamento da Imagem e do Som da Fundação Cultural do Estado da Bahia, tendo o apoio da Embrafilme e da Cinemateca Brasileira, em São Paulo.
Alexandre Robatto Filho teve uma influência bastante acentuada pela escola dos documentaristas ingleses, onde se sobressaíram o Flaherty e o Grierson, nas décadas de 1930 e 1940. Em 1949 o Robatto Filho saiu das bitolas substandard e parte para o filme de 35 mm, quando forma uma equipe onde encontramos os nomes do Semírames Seixas, Alfredo Souto de Almeida, do maestro Paulo Jatobá, Joaquim Euclides, do Manoel Pinto Ribeiro, do arquiteto e fotógrafo Sílvio Robatto e do artista plástico e amigo Carybé.
Dentre os inúmeros títulos deixados à História do Cinema na Bahia por Alexandre Robatto Filho, poderíamos citar somente alguns deles, tais como: Vadiação, Entre o Mar e o Tendal, Quando o Chico Foi Preso, Festa do Hawaí, Invenções, Carnaval, Exposição Pecuária – 1949, Caxixi, Favelas, V Exposição de Animais, S/A Wildberger, A| Marcha das Boiadas, Pecuária Baiana – 1953, Igreja, Desfile dos Quatro Séculos, Xaréu, Ginkana em Salvador, Regresso de Marta Rocha, Águas da Bahia, Organizações Suerdieck, Um Milhão de KWA etc.
Considerado “um homem de sete instrumentos” pelo próprio escritor e amigo Jorge Amado, vamos encontrar o Alexandre Robatto Filho poeta ao lado dos iniciantes daquela ocasião, tais como: Sosígenes Costa, Carvalho Filho, do inesquecível e querido amigo Hélio Simões, Enrico Alves, Jair Gramacho, do meu mestre Carlos Eduardo da Rocha, do saudoso e sempre alegre Clóvis Amorim, do Alves Ribeiro e muitos outros como ainda os artistas plásticos Carlinhos Bastos, Mário Cravo e o próprio Carybé.
Conta-se que na época do falecimento do Vadinho, em pleno domingo de carnaval na Bahia (vide Dona Flor e seus Dois Maridos) o Alexandre Robatto Filho declamou no exato momento em que o caixão do Vadinho baixava à sepultura, aqueles conhecidos e decantados versos viperinos, os quais, a exemplo dos poemas de escárnio e mal – dizer do poeta seiscentista Gregório de Matos e Guerra ou ainda dos versos maravilhosos e também ainda incompreendidos do meu amigo e poeta Antônio Short, correram como um rastilho pelas ladeiras, becos, ruelas e ruas apertadas e acanhadas da Bahia e tinham como título solene, pomposo e antes de tudo barroco: “ELEGIA À DEFINITIVA MORTE DE WALDOMIRO DOS SANTOS GUIMARÃES, VADINHO, PARA AS PUTAS E OS AMIGOS”.
Naquele época, os versos que brotaram sonoros e barrocos dos lábios profanos e gloriosos do Alexandre Robatto Filho, nos primeiros momentos foram atribuídos, quanto à sua verdadeira autoria, a inúmeros poetas da cidade, contemporâneos do inominável Robatto Filho. Mas todos chegaram uníssonos à conclusão de que com o estro, a perfeição, a galhardia, a harmonia lírica e sensual, junto com a magia e aquele jeito jocoso e sacana com que foram artisticamente escritos, só poderiam será obra de um Artista – Mais – Que – Perfeito e este era, sem sombras de quaisquer dúvidas, o próprio Alexandre Robatto Filho!
Acrescente-se que o Alexandre Robatto Filho já era bastante conhecido das noites baianas, dos saraus, encontros e tertúlias artístico – literárias como o Rei Mundial do Soneto, pois tinha escrito até aquela ocasião cerca de “20.865 entre decassílabos e alexandrinos de arte – menor e de arte maior e anacíclicos” (vide Dona Flor e Seus Dois Maridos).
Na área da literatura romanesca, nos deixou dois livros, um publicado e outro ainda inédito. O que foi publicado chama-se Raimunda Que Foi – Uma Estória da Bahia, editado em 1976 pela Editora José Olympio e que tem como pano de fundo a zona do Recôncavo Baiano, onde a estória se passa na cidade fictícia de São Bartolomeu do Recôncavo, tendo como figura central a jovem Raimunda, uma guapa e gostosa mocinha de apenas vinte anos de idade, cabelos escorridos, morena e de coxas roliças e grossas, exemplo típico das mocinhas criadas em cidades atrasadas de interior que quando perdem o cabaço, saem como que fugidas, às escondidas, dos lugarejos onde foram criadas e buscam o anonimato nos grandes centros urbanos, a fim de engrossar ainda mais esse filão interminável de mulheres que irmanadas sob o mesmo véu de infortúnio e pecados, proliferam unidas na sua única desgraça: a perda do indefectível cabaço!
Além da Raimunda, encontramos nesse livro a figura andrógena do Bernardino, bichona louca convicta e atuante que tenta retornar ao mundo dos machões, através dos encantos da ardente e sedutora Raimunda. O romance se desenrola envolvendo personagens reais e imaginárias, vivendo situações cômicas, engraçadas e picarescas. O universo mágico da literatura de Alexandre Robatto Filho nos dá um autêntico retrato do Recôncavo Baiano durante a sua fase áurea de industrialização e fúlgido progresso, num período em que o próprio Robatto Filho disse “não haver data”, mas que podemos situá-lo entre as décadas de 1940 e 1950.
Como dissemos acima, a estória da Raimunda traz à baila figuras reais que também participaram da trama, como exemplo o meu avo materno Dr. Manoel Francisco de Oliveira Bahia, o célebre Dr. Bahia, engenheiro santamarense que tinha se formado em engenheiro agrônomo, mas havia deixado as suas reais atribuições para se dedicar ás atribulações forenses. Exercia as funções de rábula, atividade que o torna afamado e conhecido em toda a região. O Dr. Bahia era casado com a jovem professora Perpedígna da Cunha Costa, filha do primeiro casamento da também professora Perpedígna Amélia da Cunha Costa com o seu primeiro marido, Ignácio da Cunha Costa. Logo, a esposa do Dr. Bahia seria também tia do Alexandre Robatto Filho, isto porque, quando a Perpedígna Amélia da Cunha Costa casou-se pela segunda vez com o Prof. Ernesto Rocha, teve como filha a Camila Rocha, que futuramente seria a mãe do nosso cineasta baiano.
Numa das passagens do romance ora em comento, o Robatto Filho narra que o meu avô, o Dr. Manoel Bahia, estava a necessitar de uma montaria para visitar o senhor Dílson, numa fazenda próxima ao município de Santo Amaro da Purificação, denominada São José dos Caboclos; então o Dr. Bahia solicita do seu amigo, o Coronel Possidônio, uma mula emprestada. O animal prontamente lhe é entregue. Todavia, o Dr. Bahia nesse ínterim fica impossibilitado de realizar essa visita ao senhor Dílson e devolve a mula ao Coronel Possidônio com um bilhete escrito no inconfundível estilo, cujo teor verídico é exatamente o que se segue:
“Meu Eminente Amigo,
Efusivos saudares!
Devolvo a sua nobre mula, pura e virgem como me mandou, por não ter sido
preciso servir-me dela.
Com os sinceros agradecimentos do cativo,
Dr. BAHIA”
O segundo trabalho literário do Alexandre Robatto Filho se intitula: “O.D.A. – Organização Demo-Angelical” e foi escrito no Natal de 1977, após o Robatto Filho ter se recuperado de um acidente circulatório que quase antecipa a sua ida ao Céu. A história é contada com o gosto e tempero baianos que tão bem caracterizam o seu estilo jocoso inconfundível. Encontramos nas suas páginas o retrato autêntico da saudosa cidade do Salvador boêmia, dos idos da década de 1920/30, com as suas roletas, bacarás, cassinos e demais casas de jogo funcionando regularmente. Era a época do Cassino Baiano que se localizava na Rua de Baixo (atual Rua Carlos Gomes), onde havia funcionado o ex-Diário de Notícias. Naquela época em Salvador aconteceu o histórico episódio “quebra-bondes” citado pelo Robatto Filho de maneira fugaz e que o escritor Jorge Amado registra com amplitude no seu livro “Tenda dos Milagres”, através do herói e bedel Pedro Arcanjo.
O terceiro livro do Alexandre Robatto Filho é um trabalho de “Memórias” que não foi editado em razão da sua morte, ocorrida em novembro de 1981, aos 73 anos de idade. Tive a oportunidade e exclusividade de ter em mãos os originais desse trabalho, quando a pedido do meu tio Robatto tive o prazer de ler e reler todo o seu conteúdo e revisá-lo, devolvendo-o posteriormente. O mencionado livro é repleto de ilustrações e desenhos que o próprio Robatto Filho executava com zelo e carinho a fim de ilustrar a presente obra. Trata-se da história da Família Robatto, a sua vinda para o Brasil, a sua chegada na Bahia, a ida para a cidade próxima de Alagoinhas, a fazenda, a roda d’água, a construção da estrada de ferro daquela cidade onde trabalharam os seus ancestrais etc.
Esperamos que algum dia a Fundação Cultural da Bahia, a Academia de Letras da Bahia através dos seus ilustres e iluminados pares, ou mesmo historiadores e pesquisadores culturais do nosso estado, tais como a querida mestra Consuelo Pondé de Sena, o poeta, historiador e memorialista baiano Gilfrancisco, o competente biógrafo João Carlos Teixeira Gomes ou mesmo a Myrian Fraga reconheçam no futuro o labor literário do Alexandre Robatto Filho e também o coloquem à altura do Alexandre Robatto Filho cineasta, como há anos atrás procedeu acertadamente a Fundação Cultural do Estado, quando deu o seu nome à Sala de Cinema que ocupa hoje lugar de destaque nas suas dependências.
Esperamos que os órgãos culturais do nosso estado, ligados não só à História do Cinema na Bahia mas também à divulgação da sua História Literária, Artística e Folclórica, consigam trazer ao conhecimento dos mais jovens esse maravilhoso legado executado pelo Alexandre Robatto Filho, que nos deixou um patrimônio imenso não somente na área cinematográfica, mas sobretudo na área de pesquisa e divulgação do nosso folclore, da nossa literatura, dos nossos costumes e tradições que devem ser continuamente preservadas, a fim de que estoriadores e jornalistas menores e mal informados não continuem a ventilar de maneira displicente, irresponsável e imoral a HERESIA sem sentido de que o pioneiro do Cinema na Bahia teria sido o Glauber Rocha! O Alexandre Robatto Filho sim, esse foi o verdadeiro PIONEIRO DO CINEMA NA BAHIA, enquanto o cineasta Glauber Rocha foi apenas o CRIADOR DO “CINEMA NOVO”!
Poderíamos falar também do Alexandre Robatto Filho pintor, desenhista, artista plástico e ilustrador. No seu apartamento situado no elegante bairro do Campo Grande, nesta Capital, hoje conservado pela prima Yeda Stazy, se encontram retratos da Família Robatto pintados pelas mãos hábeis e destras do Robatto Filho. Ao lado das suas pinturas encontramos as fotografias que o mesmo realizava e um sem número de fotos-artísticas e documentais que hoje se constituem num valioso acervo pelo alto valor e significado artístico que representam. Como podemos verificar, além de Cirurgião Dentista, foi ainda cineasta, artista plástico, escritor, poeta etc. além de ser ainda um dos pioneiros do Rádio Amadorismo na Bahia. Foi Professor Catedrático da cadeira de Radiologia da Universidade Federal da Bahia – UFBA onde exerceu com garbo e nobreza as suas funções.
Trabalhou ainda no Departamento de Educação Superior e de Cultura da Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Bahia, em diversos cargos de assessoria e escreveu também inúmeras obras de caráter científico e pedagógico, as quais deveriam ser resgatadas e atualizadas, a fim de integrarem o nosso patrimônio cultural. Finalizando, o Alexandre Robatto Filho foi um homem completo em todos os sentidos e cito apenas uma definição de uma criança de apenas quatro anos de idade, o seu neto Lucas Robatto, ao defini-lo para as pessoas da família: “VOVÔ ROBATTO SABE TUDO... VOVÔ ROBATTO SABE MAIS DO QUE DEUS!”
Quem sabe se o pequenino Lucas não tinha razão?...

segunda-feira, 26 de maio de 2014

MABEL VELLOSO, UMA MULHER E TANTO

TADEU BAHIA - Autor

“Multipliquei-me, para me sentir,
Para me sentir, precisei sentir tudo,
Transbordei, não fiz senão extravazar-me
Despi-me, entreguei-me,
E em cada canto da minha alma  há um altar a um deus diferente”
(ÁLVARO DE CAMPOS)

           
         Na pia batismal recebeu um nome solene e pomposo: MARIA ISABEL VIANA TELLES VELLOSO, porém, as pessoas da Família e os amigos só a tratam pelo nome carinhoso de MABEL, a nossa querida poetisa e escritora MABEL VELLOSO.

         Nascida em Santo Amaro da Purificação, no dia 14 de fevereiro de 1934, numa madrugada de quarta-feira de cinzas, é filha do senhor José Telles Velloso (o nosso saudoso e sempre lembrado senhor Zezinho) e da dona Claudionor Viana Telles Velloso, a dona Canozinha.

         A Mabel é uma das irmãns mais velhas dos consagrados artistas santamarenses, Caetano Veloso e Maria Bethânia, que ainda crianças foram embaladas pelas canções de ninar e a ouvir estórias de fadas, castelos e príncipes encantados, contados e cantadas pela doce e meiga irmãzinha mais velha, que desde aqueles tempos já conduzia com zelo e arte os primeiros passos do Caetano e da Bethânia pelas veredas românticas da poesia.

         A MULHER

          Pessoa dócil, meiga, amorosa ao extremo e muito dedicada, não só à sua imensa Família, bem como às suas três filhas maravilhosas que fez vir ao mundo, a fim de enfeitar-lhe a vida. A Mabel Velloso compartilha junto com as suas crianças o seu próprio universo: a Juvina Dulce, a Jú; a Maria Clara a minha eterna Lala! – e a encantadora e suave Isabel, que os nossos lábios apaixonados e carinhosos chamam simplesmente de Belô, na exuberância da sua juventude, enfeitando os momentos alegres ou tristes desta poetisa e mãe extremada; desta dona de casa aflita e preocupada com o alto índice de custo de vida, da inflação, do aumento crescente do desemprego e da falta de amor e mais compreensão entre os homens.

         Mabel, transparente igual à água, na pele de professora aposentada, que ainda participa ativamente dos estudos dos seus dois netos Jorginho e Ana Luíza, como fazia há anos atrás com as suas três filhas, ensinando e orientando nos momentos difíceis, esclarecendo dúvidas, resolvendo problemas e ajudando-os nos deveres de casa. Dois rebentos morenos do ventre abençoado da minha Lala Velloso, o Jorginho e a Ana Luíza. Recordo quando o Jorginho era pequeno e a Mabel o auxiliava nos desenhos, nas escolhas das figurinhas para ilustrarem os cartazes a fim de colocá-los no mural da escolinha etc.

Hoje a labuta prossegue inexorável com a Ana Luíza que principia a dar os seus primeiros passos na escola do mundo...

         Levando até hoje uma vida cultural ativa, quase sem descansos, a Mabel Velloso ainda encontra tempo para dividir com os trabalhos da cozinha com a sua ajudante e não é raro encontrá-la afobada e sorridente entre pratos para enxugar, panelas para temperar, roupas para lavar e recordo saudoso das fraldas do Jorginho e até bem pouco tempo também as da Ana Luíza para acabar de enxugar e depois passar a ferro, enquanto a minha Lala ralava na Universidade! Ainda tinha a lista do supermercado para fazer, ao tempo em que pedia à minha Lala para pegar o rol de roupas a fim de conferir as peças trazidas pela lavadeira.

         Uma mulher exuberante que nesta lufa-lufa intenso e meteórico da vida ainda encontra tempo e liberdade para se dedicar plenamente ao exercício da poesia, como em versos como estes, os quais descrevem de maneira sui-generis o seu cotidiano:


TEMPOS DE ENTÃO

O gás por mais de três mil!
Só panela de pressão
Para cozer mais ligeiro
O magro e duro feijão.
A cozinha tão pequena
Com fogão e geladeira
Mistura frio e calor
E atrapalha a cozinheira.
A carne vai “a galope”
Nos preços é “dianteira”
Se esconde amedrontada
No fundo da frigideira.
A comida não varia
Só bife e batata frita
Isto quando a patroa
Não é uma naturalista.

A cozinheira enfezada
Não tem prazer no fogão
E corre para a saleta
Para ver televisão.
Não canta lavando pratos
Nem preparando o almoço:
Resmunga baixo e se queixa:
“_Essa tal de inflação...”

(Extraída do livro GRITOS D’ESTAMPADOS,
Edição de 1984)


AINDA A MULHER


Dividida entre momentos de sonhos e outros de pura e cruel realidade, a Mabel Velloso não se intimida frente aos desafios da vida e prossegue na sua lida extraordinária em meio aos seus inúmero afazeres domésticos, dando conta dos seus deveres de Mãe junto às suas três filhas e ainda toma parte na vida cultural baiana ao ministrar cursos, participar de seminários, conferências, lançamentos literários e mesas-redondas sobre Literatura Infanto-Juvenil – outra das suas áreas específicas – e a Poesia!

A poesia da Mabel Velloso é leve e solta, despojada de lugares-comuns ou artifícios, plena e transbordante de amor. Uma poesia envolvente e que exprime emoção verso a verso e que hoje não mais lhe pertence, pertence sim ao patrimônio intelectual baiano e brasileiro que a consagram e a recebem de braços abertos entre outras valorosas mulheres baianas com inteligência, cultura e valor que ousamos comparar a sua personalidade, talento e o seu incessante labor cultural, sobretudo poético, a sua predisposição absoluta para o exercício da Poesia com os de outra escritora, poetisa e mestra santamarense célebre que foi a poetisa AMÉLIA RODRIGUES (Amélia Augusta do Sacramento Rodrigues) que deu a própria vida para que fossem eternizados os seus versos.

Outro trabalho maravilhoso da Mabel Velloso é o intitulado EM TEMPO, extraído do seu primeiro livro de poesias PEDRAS DE SEIXO, publicado em 1980. Ei-lo:

TEMPO vamos fazer uma troca?
Eu lhe dou as minhas rugas
Você devolve o meu rosto
Jovem e limpo como ontem.
Eu lhe dou cabelos brancos
Você me devolve os cachos
Negros, longos, bem sedosos
Assim como antigamente.
Eu lhe dou minha agenda
Cheia de notas e horários
E você me dá de volta
Meu álbum de figurinhas
Toma de mim a caneta,
Cadernos prá corrigir
Me dá de volta os meus lápis
E quadros prá eu colorir.
Eu lhe dou toda essa roupa
Que devo agora lavar
Você me dá outra vez
Bonecas para eu brincar.
Eu lhe dou a pia cheia
De pratos engordurados
E você me dá em troca
Caxixis para eu brincar.
Eu lhe dou esses transportes
Que sou obrigada a usar
E você me dá de volta
Bicicleta para eu montar.
Eu lhe dou esses meus óculos
Que da cara já não tiro
E você me dá de volta
Os meus olhos com o seu brilho.
Eu lhe dou as minhas pernas
Que já andam lentamente
Em você devolve em troca
As grossas de antigamente.
Eu lhe entrego os meus braços
Cansados de trabalhar
Você me dá os meus braços
Relaxados de folgar.

         É essa mulher que envelhece lentamente, mas continua carregando dentro de si um espírito jovem e terno, apesar da beleza romântica e sonhadoramente barroca dos seus cabelos brancos; do seu saudosismo tão natural e pleno de sabedoria e dos momentos agradáveis de regressão à infância, tão natural entre os poetas, quando a Mabel Velloso dialogando com o Tempo pede de volta os maravilhosos cachos dos seus cabelos negros, o seu álbum de figurinhas, os seus lápis de cores, as bonecas que enfeitavam toda a sua infância e hoje estão simbolizadas em “três” outras bonecas que são as suas filhas: Jú, Lala e Belô! Recentemente Papai do Céu lhe deu outra boneca mais nova, de nome Ana Luíza! 

         Apesar do eterno saudosismo, a poetisa Mabel Velloso segue adiante, quando ainda pede ao Tempo que lhe devolva a sua bicicleta antiga para que ela volte a passear pelas ruas poéticas e cheias de mistérios de Santo Amaro da Purificação... e ela se queixa do brilho dos seus olhos que o Tempo apagou e este a responde através dos olhos meigos e pacientes da Juvina Dulce, com os olhos ávidos/saltitantes/vivos e irrequietos da minha Lala e com a beleza tranqüila, reflexiva e profunda dos olhos negros da Belô! Para que mais felicidades que três tipos de olhares tão santamarenses e tão eternos, Mabel?

‘BONECAS”

Minhas bonecas de louça
Eram brancas pequeninas
Tinham olhinhos bem pretos
Parecidos com os meus
Dormiam dentro de caixas
Forradas de seda fina
Fora para mim o encanto
Do meu tempo de menina.

Cresci, ganhei três bonecas
De olhos iguais aos meus
Ah! Quem me dera guardá-las
Prá sempre dentro de mim
Forradas com seda fina!
E que prá sempre elas fossem
A alegria e o encanto
Como foram as bonequinhas
Do meu tempo de menina.

(extraído do livro PEDRAS DE SEIXO, páginas 129)



UMA MULHER E TANTO!

         A Mabel Velloso é isso: uma pessoa simples, sincera, tímida de dar vergonha e recatada ao extremo. Levando uma vida modesta, cercada de carinhos e amor pelas suas filhas e neto (a)s, procurando sempre dar bons exemplos e atitudes, sem nunca se esquecer de ensinar cotidianamente às suas filhas sobre os dogmas e mistérios da Religião Católica, pois, sendo filha de pais católicos, participa ativamente de missas, festas de Igrejas, procissões, novenas, reisados etc. passando esses sentimentos e devoções, verdadeiros atos de Fé, para a Jú, Lala e a Belô as quais seguem ao pé da letra os seus sagrados e sábios ensinamentos.

         É maravilhoso chegar à residência da Mabel, como já tive oportunidades de fazer, inclusive com a Sueli, de ver e assistir às concorridas rezas e Trezenas de Santo Antônio, onde, além das pessoas da Família, ainda congregam muitos amigos e vizinhos que ali contritos e sob o símbolo da Fé, rezam a Deus, a Santo Antônio, enfim a todos os Santos s pedir dias melhores para toda a humanidade.

         Quanto à Mabel Velloso poetisa, o seu primeiro livro foi de poesias, intitulado PEDRAS DE SEIXO, editado em 1980 pela Ranier do Nordeste e Fundação Cultural do Estado da Bahia, sendo ilustrado por fotos artisticamente trabalhadas pela Mara Sampaio, a qual, com muita sensibilidade soube captar através das suas fotografias, os momentos mais bonitos de PEDRAS DE SEIXO que teve a sua primeira edição esgotada em pouco tempo. A Mabel também participou da Antologia Poética À MATOVERDE E MAGIA, editada nacionalmente pelas Edições Contemp, do velho amigo e também escritor, poeta, Luiz Ademir Souza, que foi dedicada carinhosamente aos “50 Anos de Literatura do Jorge Amado”.

         A Mabel Velloso participou também do livro GRITOS D’ESTAMPADOS, ao lado da poetisa Claudionora Rocha, editado em 1984 e que foi especialmente ilustrado pelo Caetano Veloso, que cedeu às autoras várias pinturas da sua autoria, realizadas durante a década de 1960, sendo, portanto, raríssimas e valiosas, de alto valor documental, sentimental e histórico. Lembro que compareci a este lançamento na companhia do escritor e poeta baiano Gilfrancisco, o poeta Paulo Garcez de Sena não nos acompanhou por que estava de ressaca da noitada anterior, no Mercado das Sete Portas.

Durante a noite do lançamento de GRITOS D’ESTAMPADOS, encontramos com o poeta e compositor Jorge Portugal e o próprio Caetano Veloso que também estava presente junto com a dona Canozinha Velloso, naquele congraçamento literário que aconteceu na Igreja da Palma, numa noite fria e saudosa em Salvador – Bahia. Lembro-me que antes de sair da festa, comprei um exemplar avulso de GRITOS D’ESTAMPADOS para dar de presente ao amigo e poeta Paulo Garcez de Sena, que o Caetano e a dona Canozinha Velloso autografaram.

Na minha modesta opinião, GRITOS D’ESTAMPADOS foi um dos livros mais marcantes da poetisa Mabel Velloso, onde ficou enraizada em definitivo a sua presença no âmbito da literatura baiana e nacional, quando, ao lado da advogada e também poetisa Claudionora Rocha, apresentaram ao público e à crítica versos impregnados de forte e denso conteúdo social, mostrando no seu contexto a realidade humana sob todas as suas variáveis e dentro de uma estrutura histórica e lingüística coerentes e atualizadas, merecendo sucessivas e elogiosas referências nos principais jornais desta Capital e em outros estados, o que levou a um número recorde de vendas e logo depois, toda a sua edição também estaria esgotada. Hoje, GRITOS D’ESTAMPADOS é uma obra rara, procurada por colecionadores.

Dando continuidade à sua atividade poética, a Mabel Velloso volta-se agora para a sua terra natal, Santo Amaro da Purificação, resolvendo prestar uma homenagem aos seus filhos mais ilustres e também às pessoas simples do lugar, justamente aquelas menos favorecidas pela sorte, porém favorecidas por Deus e que mesmo assim ganham a estima daqueles que os conhecem nas ruas e avenidas barrocas de Santo Amaro, caracterizadas nas figuras simples dos seus doidinhos, das suas mulheres estropiadas e loucas, das pessoas engraçadas do lugar, sobre as quais traça um painel poético e documental de uma época que jamais retornará, a não ser nas páginas amarelecidas das nossas saudades.

Antes de tudo é um trabalho a quatro mãos, onde à tenacidade lírica da Mabel Velloso, se somam também a pureza, a plasticidade e a sensibilidade artística da fotógrafa Maria Sampaio, acima de tudo uma artista da lente... Artista sim, porque não? Existe poesia nos dedos e na imaginação daquele que artisticamente pressiona o disparador de uma máquina fotográfica. Existe ternura, talento e uma sensação que não tem nome por ser inerente ao universo cósmico do próprio artista. Quem admira uma boa fotografia de certo irá se lembrar do querido primo Sílvio Robatto, que há mais de meio século documentou a cidade do Salvador, em particular o Recôncavo da Bahia, sob os seus múltiplos aspectos: religioso, profano, popular, tradicional etc. com fotografias que são nada mais nada menos que monumentais Obras de Arte!

A Maria Sampaio não faz por menos e segue as trilhas indicadas pela poetisa Mabel Velloso e consegue dar vazão aos seus instintos artísticos ao documentar nas páginas do livro que recebe o nome de TRILHAS, as características não só fisionômicas, mas sobretudo psicológicas de cada personagem, executando um trabalho soberbo! Encontramos nesse livro da Mabel Velloso os vultos de personalidades ilustres da vida social e cultural santamarense que se projetaram muito além das suas fronteiras, tais como: Padre Gaspar Sadock, Dr. José Silveira, Prof. Adroaldo Ribeiro Costa entre outros. A Mabel Velloso conta também a história de Maria Pé No Mato (imortalizada na música do Caetano Veloso), da Bahia Doida, Bonitinho, Luiz Cumcum, Serafim Será, Mãe da Lua e inúmeros outros doidinhos que enfeitaram a sua infância descontraída nas ruas acanhadas de Santo Amaro da Purificação.

O lançamento do livro TRILHAS aconteceu em Salvador, no dia 07 de novembro de 1985 e teve as presenças da dona Canozinha Velloso e do Caetano Veloso que lá estiveram para oferecer todo o carinho e gratidão possíveis à Mabel Velloso que entre congratulações e abraços autografava os exemplares do seu livro, num ambiente de suprema e doce felicidade, onde a cidade que foi o seu berço vem agora contada nas páginas do livro, dignificada na sua poesia, retratada nas fotografias existenciais e líricas da Maria Sampaio, com os seus sobrados antigos, bailes de formaturas, as suas filarmônicas e festas do APOLO e da LIRA DOS ARTISTAS (onde nessa última o meu avô materno, Dr. Manoel Bahia, foi Orador). Das ruas românticas, barrocas e antigas da infância da Mabel Velloso, com os seus bondes puxados a burro, os seus aguadeiros, recanto encantado onde tinham viscondes, condes e baronesas, do maculelê e da maniçoba no mercado, das novenas solenes de Nossa Senhora da Purificação, das festas de Fevereiro e tantas outras recordações gostosas que deixamos os nossos olhos se embaciarem nostalgicamente com as lágrimas doces das saudades!

Depois desse livro, se seguiram outros trabalhos da Mabel Velloso, já na linha Infanto-Juvenil, quando foram editadas algumas publicações que tiveram apoio irrestrito da maioria das Escolas de Primeiro Grau em Salvador, quando as mesmas cediam à poetisa salas de aula e auditórios para que a mesma ministrasse as suas palestras, promovesse seminários de Literatura Juvenil, encontros de arte e folclore, entre outros. Esses eventos eram canalizados para a população infanto-juvenil, repetimos, que correspondia e participava plenamente, gerando um fluxo contínuo e positivo entre emissor-receptor, satisfazendo e superando de uma maneira ampla e global a todas as expectativas anteriormente propostas, resultando num trabalho técnico-pedagógico maravilhoso, sempre obtendo os maiores elogios junto à rede escolar da nossa capital. 

O resultado do excelente trabalho pedagógico-cultural desenvolvido em salas de aulas pela poetisa e escritora Mabel Velloso, adicionadas à sua experiência de Avó, fez brotar sementezinhas através de um dos seus inúmeros livros de história infantil de maior sucesso, intitulado ARRAIA AZUL. A própria Mabel Velloso me contou certo dia “que tudo começou com o Jorginho...” o seu primeiro neto, filho da minha Lala Velloso, que desta vez lhe pedira para que contasse “uma estória diferente...”, a levou a contar a estória de um menino que entrando no quarto, numa tarde de chuva, encontrou a sua avó dormindo e como não poderia sair com ela a fim de empinar a sua arraia, então amarrou a linha na ponta do robe da sua avó e qual não foi a sua surpresa quando soprou um vento mais forte que abriu as janelas e a sua avó saiu voando pelos céus, igual a uma arraia bem bonita, que o vento soprava e sacudia a fazendo dançar para lá e para cá!!

O livro ARRAIA AZUL foi publicado no ano de 1986, ela Editora Rio Gráfica Ltda. na Coleção Tempos Mágicos, Rio de Janeiro, tendo obtido o sucesso esperado e tendo sucessivos lançamentos, o primeiro em Salvador e os outros em várias cidades do interior do estado, com exemplares vendidos também em outras capitais e ainda enviados posteriormente a Portugal, motivando desta maneira a 2ª. Edição. Finalizando, constatamos com alegria que a Mabel Velloso, além de grande escritora e poetisa se torna célebre como contadeira de estórias e enquanto houver crianças existirá sempre a Mabel Velloso para lhes embalar comas suas histórias e estórias da carochinha, do príncipe encantado, da gata borralheira e um sem número de histórias e estórias de faz-de-conta, extraídas com amor e ternura daquele coração imenso e apaixonado, as cabecinhas cheias de sonhos dessas criancinhas ingênuas e puras que somos todos nós!

MÃE CANÔ

Em minha mãe envelheceu somente o corpo
A alma é jovem, a mente é linda e sã
Minha mãe é mãe, é amiga, é irmã.
Minha mãe tem dois amores
Zeca e seus oito filhos
Que ela cuida com amor e graça
Crê muito em Deus, confia na bondade
Olha o futuro com alegria e calma.
Não fala em ontem, esquece o que passou
Vive o presente e ensina isso
E ama forte tudo ao seu redor
Minha mãe é linda, doce, boa
Dança e canta como os vinte anos
E não nos deixa lembrar
Que fez oitenta.

(extraído do livro PEDRAS DE SEIXO, edição de 1980, páginas 136)





TADEU BAHIA:.